Ministério Público do Trabalho propõe greve aos petroleiros

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Dos 425 mil trabalhadores da Petrobrás, pouco mais de 15%, 65 mil, são concursados. Os demais 360 mil são terceirizados.

Uma proposta de greve nacional dos petroleiros foi o principal encaminhamento ao final de audiência pública realizada na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, na terça-feira (9/9), e presidida pelo deputado estadual Paulo Ramos (PSOL). A greve, sugerida pelo procurador Marcelo José Fernandes da Silva, do Ministério Público Federal do Trabalho, teria o propósito de pressionar o governo federal para que dê um basta no acelerado processo de terceirização da força de trabalho da Petrobrás e contra a corrupção e sucateamento da estatal. Dos 425 mil trabalhadores da Petrobrás, pouco mais de 15%, 65 mil, são concursados. Os demais 360 mil são terceirizados.

Durante a audiência, o procurador anunciou que foi dado um ponto final em longa e frustrada tentativa de negociação, por cerca de dez anos, com a direção da Petrobrás, que se recusa a substituir a mão de obra terceirizada por servidores concursados, conforme exige a legislação. Ele informou que o Ministério Público do Trabalho vai dar entrada em ação por improbidade administrativa. Para ele, a terceirização é margem para a corrupção e o desmonte da empresa.

“Vamos entrar com ação por improbidade administrativa por que a empresa não apresentou um único argumento plausível para essa situação. Não vale o argumento de que foram proibidos os concursos nos governos Collor de Mello, Itamar Franco e FHC, afinal, o problema persiste e até se agravou ainda mais nos últimos 12 anos”, esclareceu o procurador. Segundo ele, em 95, havia 40 mil concursados e 70 mil terceirizados. “Essa situação deve ser tratada no âmbito do Código Penal. A lição que fica é a de que vale a pena ser picareta, vale a pena burlar o sistema”, desabafou o representante do Ministério Público do Trabalho, ao lembrar que sequer os 70 mil aprovados em concurso de 2005 não foram chamados.

Presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobrás (Aepet) e membro do Conselho de Administração da estatal, Silvio Sinedino alertou para um dos mais graves impactos da terceirização na instituição: “Dos acidentes com mortes, 90% envolvem trabalhadores terceirizados, que recebem menos treinamento e atuam em atividades de maior risco, feitos assim de buchas de canhão”. Sinedino defendeu a mudança do caráter do concurso público para petroleiros e que este se apresente como uma oportunidade de efetivação dos trabalhadores terceirizados.

O diretor do Sindipetro Edson Munhoz apontou a terceirização da força de trabalho na Petrobrás como reflexo do modelo econômico neoliberal, que tem favorecido os interesses do lucro de empresas em prejuízo dos direitos dos trabalhadores também em outros setores, como na educação e na área da comunicação. “A terceirização tem sido uma forma de privatização da Petrobrás”, acusou. A diretora Fabíola Mônica, da Comissão da Verdade do Sindipetro e da Federação Nacional dos Petroleiros, afirmou que desde o tempo da ditadura empresarial-militar houve tentativas de privatização “por debaixo dos panos” e fez uma ressalva: “Somos contra a terceirização e não contra os terceirizados, eles próprios prejudicados por esse modelo”.

Para o conselheiro da Petros Paulo Teixeira, a terceirização de trabalhadores representa grave ameaça até mesmo para a segurança nacional, posto que essa é uma política de gestão adotada inclusive na atividade fim. Ele vê com preocupação, especialmente, os impactos da terceirização dos serviços em áreas estratégicas como no Centro de Pesquisas da Petrobrás (Cenpes). “A falta de estabilidade desses funcionários afeta o funcionamento do sistema”.

O petroleiro geofísico Brayer Lira, diretor licenciado do Sindipetro, reforçou essa preocupação ao revelar que há terceirizados, a serviço de empresas privadas, atuando no processamento de dados sísmicos, etapa de prospecção de novos poços. Ele lembrou que há mais de 60 processos trabalhistas na Justiça de terceirizados que mesmo depois de aprovados em concurso da estatal não foram efetivados.

Ao final da audiência, além da proposta da organização de uma greve nacional dos petroleiros, também houve propostas de criação de um conselho popular de fiscalização da Petrobrás. “É preciso uma forte mobilização dos petroleiros e de toda a sociedade para estancar esse processo de privatização na Petrobrás e o seu sucateamento; apesar de toda a criminalização daqueles que lutam, por meio até de assassinatos ou demissões e assédio, é preciso não desistir de resistir e lutar”, concluiu o deputado estadual Paulo Ramos.

Corrupção na Petrobrás na década de 90

O aposentado Nilton Cesário, ex-presidente do Sindipetro-Caxias, denunciou que a corrupção na Petrobrás não é fenômeno recente. Segundo ele, vem da década de 90 o esquema de favorecimento a algumas empreiteiras por meio do pagamento de propinas a funcionários da estatal e a políticos com mandatos no Legislativo e no Executivo. “Quem afundou a P-36 (por exemplo) foi o governo Fernando Henrique Cardoso”, acusou Cesário. De acordo com o petroleiro, em 1995 o diretor Paulo Roberto Costa, por exemplo, junto de outros funcionários, já fazia parte desse tipo de esquema e foi um que “bancou o processo de terceirização” na empresa. “Denunciamos na época ao Ministério Público Federal esse esquema, que identificamos como responsável pelo desvio de US$ 207 milhões da Petrobrás”, contou Cesário.

As viúvas da Petrobrás

Também participaram da audiência pescadores que acusam a Petrobrás de não ter dado o tratamento adequado para compensar os danos provocados pelo derramamento de óleo na Baía de Guanabara, ocorrido há 14 anos. Até hoje os pescadores ou suas viúvas lutam pelo recebimento de indenização no valor estimado ao todo em R$ 50 milhões devidos pela estatal. “Não só não recebemos a indenização devida, como o problema da poluição da baía pelas refinarias ainda é grave e pode chegar o dia em que não vai ter mais peixe pra gente pescar”, reclamou pescador Milton José Leite Filho, o Pardal. Integrante do Fórum dos Pescadores e Amigos do Mar, Roberto Moreno também denunciou os assassinatos de pescadores por milicianos a serviço dos canteiros de obras da Petrobrás na Baía de Guanabara.