Cobrança de metas não gera indenização por danos morais
Valor Econômico
Trabalhadores estão buscando na Justiça danos morais por serem pressionados a cumprir metas. Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs), porém, têm entendido que a cobrança, por si só, não gera indenização, a menos que seja realizada de forma ofensiva e sob ameaças, ou que os objetivos sejam inalcançáveis. “O cumprimento de metas está dentro do poder diretivo do empregador, sendo uma decorrência do mundo competitivo”, diz o juiz convocado Helder Vasconcelos Guimarães, relator de um caso analisado recentemente pela 5ª Turma do TRT de Minas Gerais.
No processo, uma ex-funcionária do Itaú-Unibanco afirma que havia “pressão desumana” para o cumprimento de metas, havendo inclusive ameaça de demissão. Segundo a autora, a cobrança era diária e havia exposição dos vendedores “lanternas”. Era enviado a todos os funcionários um relatório com ranking das agências bancárias. O relator, no entanto, considerou que “a simples exposição do desempenho de cada agência, com a indicação daquelas que apresentavam resultado abaixo da meta não pode ser considerada como ofensa à dignidade da reclamante”.
Os pedidos de danos morais por exigência de cumprimento de metas começaram a aparecer com maior frequência de cinco anos para cá, de acordo com o diretor jurídico do Itaú-Unibanco, Sergio Fernandes. “Os juízes, porém, são favoráveis à cobrança de metas, desde que não haja excessos”, diz o diretor. “Faz parte da vida. Mas como não há sucumbência na Justiça do Trabalho, pede-se tudo.”
Para a desembargadora Elizabeth Fátima Martins Newman, da 2ª Turma do TRT da 8ª Região (Pará e Amapá), relatora de um outro caso envolvendo o Itaú-Unibanco, a “cobrança de metas, desde que não exageradas, é perfeitamente possível dentro de uma instituição bancária, que precisa agir dentro do mercado financeiro com eficiência e eficácia”. E acrescenta: “É uma prática geral, inclusive no serviço público, não podendo ser vislumbrada como pressão psicológica.”
No processo, um ex-gerente da instituição financeira alegou que as metas eram praticamente impossíveis de serem alcançadas e “os funcionários eram ameaçados inclusive de dispensa”. A 2ª Turma do TRT entendeu, no entanto, com base no voto da relatora, que não ficou configurado o dano moral e reformou sentença que havia fixado indenização de R$ 30 mil.
Em uma decisão do TRT de São Paulo envolvendo a Casas Bahia, a desembargadora Kyong Mi Lee, da 16ª Turma, lembra que “o trabalho sob pressão é, hoje, inerente à sociedade moderna”. Segundo ela, cada pessoa reage de forma diferente à cobrança. “Condições tidas por insuportáveis para alguns indivíduos, para outros não o são. A prática de estabelecer metas é demandada pelos tempos atuais em razão da exigência do mercado competitivo”, afirma.
Nesse caso, porém, a desembargadora, relatora do caso, entendeu que em uma das duas situações apresentadas por uma vendedora ficou comprovado assédio moral. A turma decidiu, então, reduzir de R$ 25 mil para R$ 10 mil a indenização. A relatora considerou que a forma de cobrança de metas para vendas de garantias e seguros complementares era “inadequada e ofensiva”. Mas não classificou como “um castigo” o fato de a trabalhadora ser deslocada temporariamente para o caixa da loja.
Por meio de nota, a Casas Bahia afirma que, “embora não reconheça a prática de assédio moral, a empresa zela pelo ambiente saudável entre os seus colaboradores e reitera a aplicação de materiais educativos através de treinamentos, palestras e orientações diárias visando a inocorrência de atos reprováveis”. De acordo com a empresa, “as metas objetivam unicamente a motivação profissional, entendimento que vem sendo reconhecido pelos tribunais do país”.
Mesmo a retirada provisória de benefícios – como diárias, horas extras, de prontidão e sobreaviso – e a divulgação de listas com os nomes de empregados que não atingiam as metas não configuram danos morais. O juiz convocado Wilson Carvalho Dias, relator de um caso envolvendo a América Latina Logística (ALL) na 10ª Turma do TRT do Rio Grande do Sul, entendeu que “tais práticas não ultrapassam os limites do poder diretivo do empregador”. A reclamação foi ajuizada por um maquinista, que discutia a forma de cobrança de metas para economia de combustível. Segundo ele, aqueles que não as alcançavam, ficavam “trabalhando fixo na estação, sem receber vantagens inerentes às viagens”. Procurada pelo Valor, a ALL preferiu não comentar o caso.
Para o advogado Pedro Gomes Miranda e Moreira, do escritório Celso Cordeiro de Almeida e Silva Advogados, só há danos morais nos casos em que se evidenciar flagrantes excessos praticados pelo empregador. “O trabalhador não pode ser alvo de piadas, sofrer penalidade físicas, como flexões, tampouco ser demitido por justa causa por não cumprir metas”, diz o advogado. “O empregador, porém, pode direcionar como o trabalho vai ser realizado.”
De acordo com o advogado Geraldo Baraldi Jr., do Demarest e Almeida Advogados, é preciso ter bom senso na fixação de metas e na forma de cobrança. “Não podem ser estabelecidas metas impossíveis de serem cumpridas e nem haver excessos na cobrança”, afirma. “A instituição de metas não é um ilícito trabalhista. O próprio Conselho Nacional de Justiça impõe metas para os magistrados.”