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CNJ cria ‘taxa ética’ de 30% - Unidade Classista

CNJ cria ‘taxa ética’ de 30%

O Globo

Conselho desiste da proibição completa dos financiamentos privados

BRASÍLIA

– Depois de reunir seis votos favoráveis à ideia de proibir os tribunais de receberem patrocínio privado para eventos e congressos de magistrados, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) recuou e aprovou ontem uma resolução muito mais branda, que permite aos tribunais receberem os patrocínios, desde que o financiamento não ultrapasse 30% dos custos totais dos eventos.

Na sessão anterior do CNJ, no dia 5, os integrantes começaram a discutir o assunto com base em uma proposta de proibição completa elaborada pela ex-corregedora do CNJ, ministra Eliana Calmon, e defendida pelo atual ocupante do cargo, o ministro Francisco Falcão. Depois de seis votos a favor da ideia, o ministro Carlos Alberto Reis de Paula pediu vista. Ontem, ele apresentou a proposta de permissão até o limite de 30%.

A mudança foi negociada no fim de semana por Reis de Paula e Falcão, que cedeu diante do risco de uma ala no CNJ rejeitar a proposta original. O percentual de 30% foi sugerido pelo presidente do conselho e do Supremo, ministro Joaquim Barbosa, que, apesar de ser contra qualquer tipo de patrocínio, também temia o boicote de colegas. Ao fim da sessão, Barbosa fez uma avaliação positiva do texto aprovado.

– É uma primeira tentativa de segregar o Poder Judiciário dessas relações duvidosas, senão promíscuas, com o empreendimento privado. Nada é mais indesejável do que o juiz manter esse tipo de relação, ou, pelo menos, deixar a aparência de que esse tipo de relação tenha prevalência – disse Barbosa.

novas regras em vigor em 60 dias

A resolução, aprovada por dez votos a cinco, proíbe as associações de juízes de receber qualquer quantia de empresas para congressos. Nesses eventos, será proibido o sorteio de brindes e presentes aos juízes. A resolução também diz que magistrados só podem participar de eventos promovidos por entidades privadas, com transporte e hospedagem custeados pelas empresas, se forem palestrantes ou debatedores. As novas regras entram em vigor em 60 dias e terão seu cumprimento fiscalizado pelo próprio CNJ.

Barbosa disse que tem a intenção de reduzir a zero o percentual de patrocínio em discussões futuras sobre o tema:

– Foi uma forma de obter um consenso (a instituição dos 30%). A alegação foi de que a proibição total, imediata, brutal, acabaria com todos os eventos atualmente existentes. A minha posição e de outros conselheiros é no sentido da proibição total. Eu acho que isso virá no futuro.

Embora a resolução não expresse isso textualmente, Barbosa disse que as regras para financiamento de eventos de juízes são extensivas a empresas públicas.

– Empresas públicas no Brasil conceitualmente são assemelhadas às empresas privadas. Elas concorrem com empresas privadas. Essas empresas públicas, ou sociedades de economia mista, podem ser tidas como empresas privadas. Então, estão abrangidas também pela resolução – disse Barbosa.

O tema ganhou destaque em dezembro de 2012, quando, numa festa de confraternização, a Associação Paulista de Magistrados (Apamagis) sorteou brindes ofertados aos juízes por empresas privadas. Entre os mimos estavam uma viagem de cruzeiro e um automóvel. No dia 5, Falcão defendeu o fim integral dos patrocínios:

– A Constituição é taxativa em proibir que magistrado receba, a qualquer título, qualquer contribuição, qualquer patrocínio da iniciativa privada. Juiz tem de ser imparcial, isento e se portar de forma a dar o exemplo para a sociedade.

Ontem, Falcão recuou, em nome da aprovação de alguma regra disciplinar:

– Esse é um passo inicial. Poderemos dar um passo mais adiante, daqui a uns meses, quem sabe, restringindo tudo, como eu havia proposto antes. Houve um consenso para que nós pudéssemos aprovar uma resolução que atende em parte os anseios da sociedade. Esses eventos, na grande maioria, não têm nenhum efeito cultural, principalmente esses feitos nas praias.

Conselheiro sugere patrocínio eventual

Na sessão de ontem, Reis de Paula defendeu regras claras para os eventos:

– Devemos zelar pela magistratura e fazer com que ela cumpra a ética. Como agente do Estado, o juiz deve agir como a mulher de César. Não basta ser bom, é preciso parecer bom.

O conselheiro Silvio Rocha foi o primeiro a divergir. Para ele, o Judiciário deveria custear seus congressos e simpósios, tornando os patrocínios privados eventuais. Ele não fixou percentual de financiamento externo. Rocha questionou a viabilidade da resolução:

– Os recursos serão depositados na conta de quem? Quem vai operacionalizar os gastos?

Rocha ponderou que é impróprio juiz participar de evento em que o tema é de interesse do patrocinador.