Audiência no Senado debate direito de greve dos servidores
Promovida pela Comissão de Direitos Humanos (CDH) do Senado, nesta segunda (3), a audiência conseguiu firmar dois consensos. Primeiro, o de que não é possível restringir o direito de greve sem, antes, regulamentar uma política de reajuste para as categorias. Segundo, o de que o assunto não pode ser discutido de afogadilho, no bojo de um movimento em curso, que conta com especial campanha conduzida pela mídia para criminalizá-lo.
Carta Maior
Brasília – A audiência pública promovida pela Comissão de Direitos Humanos (CDH) do Senado, nesta segunda (3), para discutir o direito de greve dos servidores públicos conseguiu firmar dois consensos importantes sobre o tema. Primeiro, o de que não é possível regulamentar o direito de greve sem, paralelamente, aprovar uma política de reajuste para as categorias. Segundo, o de que o assunto não pode ser discutido de afogadilho, no bojo de um movimento em curso, que conta com especial campanha conduzida pela mídia para criminalizá-lo. “Em 20 anos, não houve interesse de governo algum de aprovar o direito de greve. Por que fazê-lo agora, do dia para a noite, sem discuti-lo com a sociedade, em meio a um movimento?”, questionou o presidente da CDH, senador Paulo Paim (PT-RS), autor de dois projetos sobre o tema.
De acordo com ele, a ideia de promover a audiência surgiu em meados da semana passada, quando o Senado anunciou a intenção de aprovar, em esforço concentrado, o projeto de lei 710/2011, de autoria do senador Aloysio Nunes (PSDB-SP), que dispõe sobre o direito de greve. A proposta era que o projeto de Nunes, que já havia passado pela Comissão de Assuntos Sociais (CAS), fosse aprovado esta semana pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), em caráter terminativo. De lá, seguiria para a Câmara. Paim, entretanto, requisitou que a matéria fosse debatida também na CDH, ganhando tempo para realizar essa e outras audiências.
Considerado altamente restritivo pelo movimento sindical, o projeto do senador tucano corta integralmente o ponto dos grevistas a partir da deflagração do movimento, admitindo, no máximo, o pagamento de 30% do total dos vencimentos. Prevê, ainda, que apenas 20% dos trabalhadores em atividades essenciais possam aderir ao movimento. No caso dos demais serviços, somente 50%. Estipula, ainda pesadas multas aos sindicatos, caso a Justiça decrete a greve ilegal.
Segundo Paim, da mesma forma com que toda vez que há um crime de
grande repercussão nacional, a extrema direita volta a cobrar a aprovação da pena de morte, sempre que ocorre uma grande paralisação o mesmo setor recorre ao Congresso para cobrar a proibição da greve. “Regulamentar o direito de greve é uma coisa. Proibir é outra. Não podemos avalizar um projeto que irá inviabilizar a greve para os trabalhadores públicos. O direito de greve foi instrumento até para conquistarmos a nossa democracia e deve ser assegurado a todos”, defendeu.
O presidente da Associação Nacional dos Auditores da Receita Federal do Brasil, Álvaro Solon, considerou inadmissível se debater o direito de greve sem que, paralelamente, se discuta também como se dará a política de recomposição salarial dos servidores públicos. Para ele, as duas coisas precisam ser feitas em consonância. Solon alega que, por falta da regulamentação de uma política, as perdas salariais dos servidores não são recompostas. E é por isso que, quando chegam a entrar em greve, as reivindicações somam percentuais altos de reajustes, usados pelos governos para jogar a opinião pública contra os servidores.
Representando a diretoria executiva da Central Sindical Conlutas, Paulo Barela reafirmou que o prolongamento da greve no serviço público tem sido uma estratégia usada pelos governos para tentar esvaziar o movimento e jogar a opinião pública contra ele. “Este ano, durante quatro meses, os servidores realizaram nove reuniões com o governo, em que não foi apresentada nenhuma contraproposta às reivindicações. Eles foram induzidos pelo próprio governo a deflagrar a greve”, alegou.
O sindicalista lembrou que, durante a década de 1990, 60 itens de direitos dos trabalhadores foram cassados e, no início do governo Lula, ainda houve a reforma da previdência, que prejudicou ainda mais os trabalhadores. Ainda assim, admitiu que o governo do PT recuperou parte do poder aquisitivo dos servidores públicos federais. “No entanto, ainda não temos direito à data base, à convenção coletiva. Os acordos, quando ocorrem, são pontuais”, criticou.
O secretário de Relações do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Manoel Messias Melo, concordou que direito de greve e política salarial devem ser discutidos juntos. “Para o Ministério do Trabalho, é estranho se regulamentar o direito de greve sem, primeiro, definir as regras da convenção coletiva dos servidores”, afirmou. Segundo ele, o Supremo Tribunal de Federal (STF) já definiu que, pelas regras atuais, não cabem aos servidores acordo coletivo e outros dispositivos válidos para os trabalhadores regidos pela CLT. “Permanece a indefinição”, alegou.
O secretário ressaltou que a regulamentação precisa ser devidamente debatida com a sociedade, já que comporta várias polêmicas. Entre elas, a definição do eu são serviços essenciais e quais percentuais de trabalhadores desses serviços devem continuar trabalhando em caso de greve. “É importante se ter em mente que os direitos entre os trabalhadores devem ser iguais, mesmo que respeitadas as especificidades de cada área. Se na iniciativa privada são definidos percentuais para serviços essenciais, no setor público também deve ser assim”, argumentou.
Outro tema polêmico apontado por Melo se refere ao direito de greve para as carreiras da segurança pública. “Não há um padrão internacional a ser seguido”, justificou. Segundo ele, o único consenso é sobre a não utilização de armas por trabalhadores do setor em greve.